É o caso do Centro-Oeste, onde área de soja protegida subiu 500 mil hectares
A ocorrência de eventos climáticos extremos no país nos últimos anos e a maior dificuldade de prever intempéries e seus efeitos no campo têm, aos poucos, aquecido a procura por seguro rural em regiões que tradicionalmente não buscavam a proteção.

A área segurada de soja, principal produto atendido pelo mercado segurador por meio do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) no país, já ultrapassou a de 2023. Glaucio Toyama, presidente da Comissão de Seguro Rural da Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg), afirmou que já são 3,8 milhões de hectares de soja assegurados para a safra 2024/25 contra 3,1 milhões de hectares no ciclo passado.

Produtores de soja de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Distrito Federal contrataram apólices para assegurar 1,6 milhão de hectares, acima dos 1,1 milhão de hectares na safra 2023/24.

É o caso de Dieicson Siqueira Serpa, que plantou soja em 1,5 mil hectares, área que será ocupada por milho e sorgo depois que a oleaginosa for colhida, em Goiatuba, Morrinhos e Panamá, no sudoeste de Goiás. Parte das lavouras está segurada. “O seguro é uma estabilidade para me manter no mercado. Pela questão climática, é difícil arriscar dinheiro do próprio bolso ou de financiamento sem nenhum tipo de seguro, sujeito a tudo: chuva, seca, granizo”, diz.

Nos últimos anos, ele teve perdas pontuais e acionamento de sinistro na segunda safra de sorgo. Para Serpa, o preço ainda é empecilho para expandir a contratação de seguro. “Quando o produtor tem área de recurso próprio, não faz seguro, pois é muito caro e inviabiliza o negócio”, afirma.

Dieicson Siqueira Serpa, produtor rural; "seguro é uma estabilidade para me manter no mercado" — Foto: Arquivo pessoal
Dieicson Siqueira Serpa, produtor rural; “seguro é uma estabilidade para me manter no mercado” — Foto: Arquivo pessoal

A Brasilseg , que lidera o segmento de seguro rural no país, relatou aumentos de 719% e 134% nas contratações de apólices para seguro floresta e pecuário, respectivamente, entre janeiro e agosto na comparação com o mesmo período de 2023. A área segurada de floresta plantada passou de 52 mil para mais de 426 mil hectares. A área de pasto protegida saiu de 4 mil para mais de 10 mil hectares.

Mesmo com o aumento da cobertura, o ano tem sido desafiador para as seguradoras que operam com ou sem subvenção. Até agosto, o volume de arrecadação com seguro rural caiu 3,2%, para R$ 9,6 bilhões, conforme dados da Susep compilados pela Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg). As cifras consideram também os seguros de vida e penhor rural.

A entidade reduziu a projeção de crescimento para o mercado de seguro rural em setembro para 1% neste ano. Em junho, a expectativa era de um avanço de 7,9%. No fim de 2023, de 23,1%. A justificativa para o corte foi a demora no desembolso da subvenção do PSR.

Outra razão é a queda no preço médio do seguro rural (prêmio) de 7,47% para 6,86%, acompanhando o aumento da contratação fora do Rio Grande do Sul e Paraná — historicamente os principais consumidores do instrumento —, o que ajudou a pulverizar o risco. O dado, da FenSeg, considera apenas o seguro das lavouras.

O resultado está aquém das expectativas do mercado, que enxergava potencial de expansão com o maior interesse dos agricultores pelas apólices, segundo Toyama.

O esgotamento do orçamento do PSR, mesmo que mais tarde do que o habitual, freou uma possível recuperação mais forte do mercado. Foram aplicados quase R$ 890 milhões após cortes e congelamentos, o menor valor desde 2020, sem considerar R$ 210,8 milhões que começarão a ser liberados para apólices no Rio Grande do Sul.

Em ofício encaminhado aos ministérios da Agricultura, da Fazenda e do Planejamento e Orçamento no fim de outubro, a comissão da FenSeg cobrou o desbloqueio de R$ 52,9 milhões do orçamento do PSR e solicitou uma suplementação de R$ 197,8 milhões para atender o estoque de apólices ainda sem subvenção e a demanda estimada até o fim do ano.

O pedido tem pouca chance de prosperar em momento de discussões sobre corte de gastos no governo. O secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Guilherme Campos, afirma que, por mais que haja o apelo das mudanças climáticas, disputar orçamento com outras áreas ficou mais difícil.

“O problema é que o recurso está muito pequeno. Ajuda, mas não resolve. Mas estamos vendo a situação do caixa do governo, é só tesoura”, diz. Segundo ele, há compromisso para que os R$ 52,8 milhões bloqueados ao longo do ano retornem ao caixa do Ministério até dezembro.

A situação ligou o alerta das seguradoras para a próxima safra de inverno, que concentra maior risco climático, em 2025. A demanda por apólices está acelerada, mas há indefinições sobre o orçamento para o ano que vem.

O projeto de lei orçamentária de 2025 prevê R$ 1,06 bilhão para o PSR. A forte elevação das alíquotas do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro) pode forçar a migração de público para o seguro rural e aumentar a disputa pela verba, avalia Toyama, da FenSeg. O cenário deverá ser de escassez de recursos, principalmente para a safra de inverno.

“Isso afeta toda a situação. Se não existe uma proposta muito clara, ou o produtor fica sem seguro, compromete a margem e compra com alíquota de 20% a 30% no Proagro ou compra seguro entre 10% e 15%. Se não tiver subvenção, ele diminui o nível tecnológico da lavoura, o que impacta na produtividade”, afirma Toyama.

“Estamos trabalhando para sensibilizar o governo quanto à necessidade de elevarmos a dotação para pelo menos R$ 2 bilhões, mas ainda não temos uma resposta positiva quanto a essa demanda”, afirma Esteves Colnago, diretor de relações institucionais da CNseg.

O que preocupa é que, mesmo com esse aumento na adesão ao seguro, o país está nos mesmos níveis vistos há uma década e bem longe do pico visto em 2021, diz James Hodge, diretor de agronegócio e construção da corretora WTW. “Ainda há pouca aderência no seguro rural se pensarmos que entre 10% e 15% dos produtores são segurados”, afirma.

Neste ano, Hodge notou aumentos pontuais no interesse por produtos rurais após os incêndios em agosto e setembro. “Tivemos picos de demanda para citros, por exemplo, e uma busca por causa da estiagem”, relata. Mas a perspectiva de chegada do La Niña e do aumento das chuvas, o interesse voltou aos níveis normais, diz.